Violência policial em Parnaíba é ofuscada por anúncio de câmeras nas ruas
Enquanto a violência explode em plena luz do dia — e em frente às câmeras — o anúncio de um investimento milionário em vigilância digital surge em Parnaíba como uma névoa espessa: bonita de se ver, mas que pouco ajuda a enxergar o que realmente importa. Nem um pio sobre o caso que ganhou repercussão nacional.
Na última terça-feira (15), o secretário de Segurança do Estado, Chico Lucas, anunciou com entusiasmo a instalação de 1.200 câmeras de alta tecnologia em Teresina e Parnaíba. Trata-se do chamado SPIA — Sistema de Policiamento por Inteligência Artificial — com recursos de R$ 31 milhões. O projeto promete reconhecimento facial, leitura de placas, sensores com alcance de até dois quilômetros e conexão em tempo real com as centrais policiais.
É, sem dúvida, uma iniciativa moderna. Mas há perguntas no ar — ou melhor, no asfalto quente de Parnaíba.
Dois dias antes do anúncio, um jovem borracheiro foi brutalmente agredido por três policiais militares da cidade. A abordagem, flagrada por uma câmera (dessas que já existem, veja bem), mostra socos, chutes, arma apontada e até um "mata-leão". A vítima sequer resistiu: estava comprando algo em um comércio local, de capacete, como proteção contra o sol. Um detalhe que, aparentemente, bastou para justificar a truculência.
A ação foi filmada. Os policiais foram afastados. E o caso virou manchete nacional. Mas do alto do novo projeto de vigilância, nada se ouviu — até agora — do secretário de Segurança sobre essa violência específica. Nenhuma nota, nenhuma fala pública, nenhum gesto.
As câmeras vêm. A inteligência artificial também. Mas a inteligência institucional de olhar para os excessos da própria tropa... essa ainda parece estar em fase de testes.
Não se questiona aqui a importância da tecnologia. O que se questiona é a hierarquia das urgências. Para um cidadão que sofre violência do próprio Estado, de que adianta mais câmeras se o problema está justamente em quem deveria protegê-lo?
O silêncio institucional diante de episódios como esse ecoa mais alto que qualquer sirene. Porque não se trata apenas de vigiar o povo — mas de garantir que o povo também seja protegido, inclusive (e principalmente) da arbitrariedade.
No fim, a pergunta permanece: as novas câmeras vão gravar também a violência de farda? Ou servirão apenas para criar belos relatórios e manchetes esperançosas — enquanto a realidade, esta sim em alta definição, continua sendo ignorada?

