A glamourização das corridas de rua na cidade, mais um triunfo da elite
Não que correr não seja saudável, todos sabemos que qualquer exercício é válido e recomendado, o ponto aqui não é desmerecer a corrida, mas observar como, de repente, ela virou palco de status. A corrida de rua, que nasceu como prática simples e acessível, virou produto de luxo, vitrine para quem sempre encontra uma nova forma de se distinguir.
Quem não se recorda da febre do beach tennis em Parnaíba? Ou da onda do ciclismo de trilha? Tudo isso ainda existe, mas já não pulsa como antes, porque foram modismos importados pelas elites de fora e alimentados pelas elites locais.
Hoje, na cidade, as competições precisam até se organizar em calendário para não se atropelarem, tamanha a agenda da chamada saúde ostentação. E claro, não basta correr, é preciso correr com o tênis de dois mil reais, com a camiseta da equipe que carrega nomes pomposos como elite do asfalto ou força máxima, ou qualquer infantilidade que soe a exclusividade de quem tem muitos dígitos no Pix.
É curioso, o que deveria ser prática libertadora e quase meditativa, virou desfile organizado de performance, passarela do suor higienizado. A corrida, que poderia ser sinônimo de leveza e liberdade, virou competição de branding pessoal, gente que corre menos pelo corpo e mais pelo feed, menos pelo fôlego e mais pelo enquadramento da foto.
E não para por aí, existe toda uma liturgia da corrida gourmet, a inscrição não é barata, o kit precisa vir com camiseta tecnológica, medalha pesada e foto oficial para as redes sociais. No final, mais do que quilômetros, o que se coleciona são registros cuidadosamente produzidos, prova de pertencimento a um clube invisível, onde o verdadeiro troféu é aparecer correndo bem e caro.
Talvez o que se venda nessas corridas não seja saúde, mas o mesmo de sempre, distinção social com filtro esportivo. Uma nova fase do velho jogo da elite, transformar até o ar da manhã em moeda de capital simbólico, estetizar até o ato de suar. E assim, o que era para ser espontâneo e democrático, vai sendo empacotado, regulado, vendido, até se tornar só mais um palco de quem corre mesmo é para não perder o protagonismo.
